Após perder parcialmente a visão, Grazi retorna às quadras e inspira o Amazonas nos Jogos da Juventude CAIXA Brasília 2025
Atleta enfrentou a artrite reumatoide e ficou meses afastada do futsal. Agora aos 17 anos fez sua estreia na competição nacional

Gabriel Heusi/COB
Quando marcou um gol pelos Jogos da Juventude CAIXA 2025, em Brasília, Gazielli Souza sorriu como quem vence muito mais do que uma partida. Foi no empate com São Paulo por 3 a 3 pela fase de grupos do futsal da terceira divisão, mas pouco importava o resultado naquele momento. Aos 17 anos, a ala de Lábrea, Amazonas, reviveu em quadra o que parecia impossível há pouco mais de um ano: enxergar, correr e praticar o esporte que mais ama.
Em 2023, aos 15 anos, Grazi começou a perder a visão de forma repentina. No início, era apenas um pequeno caroço no olho, depois pequenas dificuldades para enxergar, mas logo os sintomas se agravaram e chamaram a atenção de quem convivia com ela todos os dias. Foi então que a treinadora Silmara Maia percebeu que algo não estava certo.
“Eu via que a Grazi estava sempre com o rosto muito vermelho. Um dia perguntei o que estava acontecendo e ela disse que não estava enxergando direito. Foi desesperador. Uma menina tão nova, praticamente cega. Corremos atrás de atendimento e descobrimos que não era problema de visão, mas sim artrite reumatoide, que já estava afetando a vista dela”, relembrou a técnica.
A doença avançou a tal ponto que Grazi já não conseguia mais caminhar sozinha. Diante da gravidade, não havia outra saída: era preciso buscar ajuda fora do município. O destino mais próximo com estrutura médica era Porto Velho, em Rondônia, a cerca de 500 quilômetros de distância. Foram longas horas de estrada até chegar à capital rondoniense, onde finalmente recebeu um diagnóstico – mas, infelizmente, o tratamento inicial não trouxe a melhora esperada.
“Foi um momento muito estressante da minha vida. Eu só chorava. Minha mãe precisava me guiar, porque eu não enxergava nada. Quando o médico falou que ainda bem que eu tinha ido cedo, porque a doença podia afetar o coração, eu fiquei com muito medo. Achei que nunca mais ia jogar”, recordou a jovem.
Sem a melhora, e vendo a visão da menina piorar a cada dia, a família precisou dar mais um passo. A nova esperança estava em Manaus, a quase 900 quilômetros de seu município, acessível apenas após um dia inteiro de ônibus ou vários dias de barco. Foi lá que ela iniciou o tratamento adequado e recebeu a confirmação de que sofria de artrite reumatoide, uma doença inflamatória grave que atinge diretamente a visão.
O diagnóstico trouxe junto outro obstáculo: o custo do tratamento. Cada dose da medicação necessária para controlar a doença chegava a 20 mil reais por mês – um valor impossível para a realidade da família.
“Minha família ficou muito preocupada, porque não tinha como tirar esse dinheiro todo mês. Mas graças a Deus consegui o remédio pelo governo. É uma injeção que eu tomo toda semana. Se não fosse isso, eu não estaria aqui hoje”, explicou a ala.
Para Grazi, perder a visão era como sentir seu maior sonho escapar. O futsal sempre foi o seu refúgio: o lugar onde se encontra, se sente leve e verdadeiramente feliz. Desde a infância, foi o esporte que lhe deu amigos, disciplina e propósito, tornando-se parte não apenas da sua rotina, mas de quem ela é. “Eu amo jogar, amo estar dentro de quadra. É o único canto em que eu me distraio de verdade. Quando pensei que poderia perder isso, fiquei mal demais. Hoje, cada vez que entro em quadra, é uma vitória”, afirmou.
O retorno de Grazi e sua presença nos Jogos da Juventude CAIXA Brasília 2025 não significaram apenas uma vitória individual. Foi também uma conquista coletiva para toda a equipe, que sofreu com o impacto do diagnóstico da companheira e hoje comemora a chance de vê-la brilhar novamente em quadra.
“Tudo o que ela passou inspira a gente, motiva. Quando entramos em quadra, não jogamos apenas por nós mesmas, mas umas pelas outras. E com a presença da Grazi isso se torna ainda mais forte”, contou a companheira de time, Nivea Eloise.
“Estar aqui já é histórico para a gente. Viemos de tão longe, enfrentando tantas dificuldades, e poder ver a Grazi jogando depois de tudo o que passou é um presente de Deus. Os Jogos da Juventude CAIXA são uma experiência única, que marca a vida dessas meninas. Tenho certeza de que cada uma delas vai levar esse momento para sempre”, resumiu a treinadora Silmara.